Engana-se
quem pensa que o carnaval de Salvador é somente abadá
e trio elétrico. Ainda que esse seja o lado mais conhecido
da festa, sobra espaço para quem prefere relembrar os tempos
das marchinhas e do confete que faziam a alegria do folião
há décadas atrás. O bloco de travestidos Pierrot
Tradição é um dos que ainda apostam nessa nostalgia.
Mantendo a tradição da fantasia e da máscara,
elementos típicos da festa de antigamente, seus integrantes
desfilam todos os anos levando cor e alegria para a avenida.
Criado
em 1960, o Pierrot Tradição nasceu de uma simples
brincadeira. Tudo começou quando Ademir Ribeiro, um dos fundadores,
resolveu reunir um grupo de amigos fantasiados para brincar no carnaval
de bairro que acontecia em Plataforma, subúrbio ferroviário
de Salvador. Nessa época, as roupas eram costuradas por uma
pessoa da família de Ademir e a brincadeira ficava restrita
às ruas da própria comunidade. Somente em 1992 o Pierrot
Tradição passou a desfilar no carnaval do centro da
cidade e hoje já faz parte do calendário oficial da
festa.
Robson Bunes,
presidente do bloco, faz parte do grupo há dez anos e confessa
que antigamente
não gostava muito da brincadeira, não via os pierrots
com bons olhos porque eram mascarados. "Tinha medo", brinca.
Atualmente, ele trabalha com manutenção de aparelhos
de ar-condicionado é um dos que se empenham em reafirmar
as origens do grupo. Para fazer com que as pessoas tenham sempre
na memória as melhores lembranças dos velhos carnavais,
o grupo segue um principio básico - A tradição
é sair e brincar em paz, levar alegria para o folião",
resume Robson.
Além
desse desejo, o Pierrot Tradição tem a disciplina
como marca registrada. O bloco reúne de 60 a 80 associados
a cada ano, entre homens, mulheres e crianças e pra participar
só se for indicado por algum integrante. Segundo Robson Bunes,
essa foi um das medidas de precaução tomadas pela
diretoria a partir de um determinado ano em que a prefeitura proibiu
a saída de pessoas mascaradas no carnaval por conta da violência.
O grupo já chegou a ser ameaçado de extinção
porque um de seus integrantes envolveu-se em uma briga utilizando
a fantasia do bloco. Desde então, foram criadas algumas regras
de convivência relacionas aos horários e ao uso de
bebidas, por exemplo.
Como o grupo
é pequeno em relação aos blocos de trio que
participam do desfile, a disciplina
acaba sendo também uma estratégia que ajuda o Pierrot
Tradição a não passar despercebido quando entra
na avenida. Além de já chamarem a atenção
pela fantasia, os Pierrots sempre marcam presença fazendo
uma grande roda pra "avisar" que chegaram. Além
disso, quando precisam se deslocar de um lugar para outro, andam
todos em fila, orientados pelos apitos de dois integrantes da diretoria.
Outra regra de convivência diz respeito à união.
"Ficamos juntos até o fim da festa", diz o presidente.
Robson Bunes
diz que o carnaval de hoje é uma verdadeira "indústria",
pois a maior parte das instituições participa da festa
com a intenção de lucrar. O Pierrot Tradição
costuma desfilar dois dias no centro da cidade. No domingo, participam
do circuito do Campo Grande, saindo da Rua Chile. Apesar do espaço
ficar quase totalmente tomado pelas multidões que vão
atrás do trio elétrico, o presidente do bloco diz
não se importar. "Somos um bloco ousado e mostramos
nossa alegria e beleza", diz.
Na terça,
é dia de desfilar no Pelourinho, onde ainda é possível
encontrar traços do carnaval dos tempos da fobica de Dodô
e Osmar. Ali eles desfilam ao som de antigas marchinhas e se sentem
em casa. Segunda é o dia de relembrar a brincadeira dos anos
60. Ao invés de ir para o centro, o grupo sai pelas ruas
de Plataforma fazendo festa de casa em casa, como antigamente. Nos
últimos anos, toda a folia tem sido registrada por um cinegrafista
e um fotógrafo contratados pelo bloco.
Alem de marcar
presenca todos os anos no carnaval, o Pierrot Tradição
já participou de eventos como a Caminhada Axé e a
Lavagem da Fundação Cultural e o grupo esta tentando
viabilizar uma inserção oficial na Micareta de Feira
de Santana. Quem participar da programação cultural
da SBPC também terá a oportunidade de conhecer o trabalho
dos pierrots de Plataforma, vestidos com suas "fantasias mágicas"
e cheios da alegria ingënua e sentimental do tradicional personagem
de comedia italiano.
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