Confira audio com as falas de Ubiratan Castro e Zulu Araújo.

 

 

 

 

Algazarra de Opiniões
Mismana Militão


O presidente do Olodum, João Jorge, o diretor do Centro de Estudos Afro Orientais (CEAO) da UFBA, Ubiratan Castro, a diretora e autora teatral Ana Franco e a representante da tribo indígena Kiriri, Iracema Iamaiara, discutiram baianidade no Algazarra de Opiniões, promovido pela SBPC hoje (15/7) à tarde. O debate foi apimentado. Os convidados criticaram o discurso de paz em meio à diversidade cultural, construído pela indústria do turismo no estado e calcado na desigualdade, e ainda a obrigação do cientista em se antecipar, com propostas de melhoria social, à revolta popular.

"Eu gosto muito de pessoas brancas", esclareceu de primeira o presidente do Olodum, João Jorge que diz ter ficado surpreso ao ser chamado pra falar sobre brancos e elogiou o objetivo do encontro "de entender um ao outro". João Jorge fez um discurso de raiva. Trouxe os números da Bahia campeã nacional do racismo que tem 10% de sua população branca e a metade deles pode comprar de tudo. Que em 150 propagandas de outdoor produzidas em Salvador no último período de carnaval e 160 para o Dia dos namorados todas excluíram completamente a figura do negro. "Não posso ter calma com quem é opressor". Para o líder do Olodum, a absurda desigualdade vai gerar explosões de revolta cada vez maiores e constantes.

O professor Milton Santos, falecido em junho, reconhecido internacionalmente como um dos mais respeitados geógrafos no estudo da globalização, foi citado e homenageado. Conceitos como os de país construído e de intelectual político marcaram as discussões. A platéia aplaudiu o nome, vida e obra desse cientista "negro e corajoso" como chamou o amigo Ubiratan Castro. "O Brasil precisa de Miltons, mil tons, mil Milton Santos" justificou o diretor do CEAO.

A proposta do espaço Algazarra de Opiniões foi ousada e irreverente. Decorado com tecidos de estética africana da artista Goya Lopes, uma pequena ala debaixo da escada do primeiro piso da Biblioteca Central, no Espaço Mestre Didi, chamou a atenção do público que circulou entre as exposições permanentes do local. Os convidados fizeram, do bate-papo no sofá, provocações, discursos e respostas aos participantes. A platéia foi rotativa, cerca de 20 pessoas acompanharam todo o debate, visitado por outras dezenas. Duas caixas de amplificação de som expandiram o alcance das discussões que atraiam os curiosos.

Os catarinenses Graziela Peixer e Rodrigo Moreira que vieram de Blumenau para a 53° SBPC, procuravam informações sobre ônibus na cidade quando perceberam o que acontecia no espaço do Algazarra. Atentos do início ao fim. Os turistas disseram estar impressionados com as discussões que "tiraram a máscara, mostraram como é frágil o cenário" que se vende da terra e povo baianos. Rodrigo lembrou a última SBPC que participou, a de 99 em Porto Alegre. Disse que, no Sul preconceito é assunto de pouco incômodo.

No entanto, foi consenso entre os que se expressaram no Algazarra a necessidade de que debates como esse fossem mais valorizados dentro da programação geral da Reunião. "Ficamos num cantinho, que eu gosto, mas é um cantinho", ponderou Ubiratan Castro.


O Algazarra e a cidade

Os acontecimentos recentes em Salvador, foram o assunto mais empolgante e repercutido da tarde. Os convidados e espectadores analisaram as greves, organizações de protesto e a violência como linha final de escape num sociedade marcada por desigualdades cruéis e históricas. Uma ligeira retrospectiva mostrou que é inútil dizer que a Bahia é da paz. Salvador é uma cidade de motim, explosão de várias manifestações populares.

O diretor do CEAO, Ubiratan Castro, polemizou. Disse que os saques, multiplicados devido à paralisação das polícias em Salvador, foram, na maioria, de meninos de rua que precisam ser defendidos. "O ano inteiro eles são provocados em sua pobreza pela política de mercado que diz consuma, compre o que nunca vão ter. Agora o pobre que não levou, quebrou. E fez muito bem", declarou Ubiratan.

Da platéia, o produtor cultural e ex-presidente do Olodum, Zulú Araújo questionou o posicionamento da SBPC diante dos problemas da sociedade baiana nos últimos dias. "Que SBPC é essa?", parodiou o tema "Bahia, Bahia que lugar é esse? ", o produtor depois de citar os números: em cinco dias 148 feridos, 71 atingidos por armas de fogo e 30 mortos notificados pelo Hospital Geral em Salvador. Araújo disse que a ausência de qualquer reação das lideranças da Instituição contribui para a máscara de "Ilha de Excelência" que a elite opressora criou para vender a Bahia no país e no mundo.

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