Prof. Dr. Paulo Costa Lima

"Temos uma democracia precária, um governo anti-popular, uma situação muito difícil, de desigualdade e miséria; tudo isso é agravado pela ausência de uma política cultural realmente séria."

 
 
 

 

 

 

Prof. Dr. Ordep Serra
Chefe do Departamento de Antropologia da FFCH


Na sua opinião, qual a importância de uma discussão sobre identidade cultural, hoje, em Salvador?

É um tema muito importante e que é preciso qualificar, por que se fala muita bobagem a respeito disso. Todos os antropólogos e sociólogos já vivem de mau humor com a banalização que sofreu a temática da identidade, que é apresentada no discurso mais comum de uma maneira reificada e contraproducente. É preciso, entretanto, dar ênfase ao papel da diversidade cultural, ao reconhecimento da diversidade cultural, e relacionar isso com a temática da democracia no Brasil, que é uma coisa que a gente vem tentando instalar neste país e não instalou ainda. Nós temos uma democracia precária, que vai mal das pernas; temos um governo anti-popular; temos uma situação muito difícil, de desigualdade e miséria no Brasil; e isso é agravado pela ausência de uma política cultural, por exemplo, no país, realmente séria. Então, é preciso um debate que aborde essa questão de maneira digna, não é? Os estudiosos, os pesquisadores, os cientistas, todos esses que estão agora, por sinal, sofrendo os efeitos de um obscurantismo dominante no país, que eles reajam e discutam este assunto com a máxima seriedade.

Como isso tudo reflete no fazer artístico, na teoria e na prática?

A falta de um bom entendimento do que deve ser uma política cultural que contemple a diversidade, que é o tema da SBPC, afeta também os artistas, é claro. Você tem, por exemplo, um Ministério da Cultura que gasta milhões com um filme e que deixa na miséria a área de preservação cultural. Veja o que está acontecendo com o Patrimônio Histórico Nacional: está às moscas! Sem gente qualificada para trabalhar, com funcionários mal remunerados, com um descaso absoluto pela memória nacional. Então essa coisa criminosa que está acontecendo se reflete, claro, por exemplo, no etnocentrismo que rege essa política, para falar como antropólogo.

O senhor pode nos indicar grupos que trabalhem o outro lado dessa questão, que conseguem explorar a diversidade cultural brasileira?

Claro, aqui na Bahia mesmo nós temos, no meu departamento, o Departamento de Antropologia, nós temos um grande programa de estudos com os índios do nordeste do Brasil. É um programa que inclusive está fazendo desde levantamentos etnográficos a estudos históricos, jurídicos, e que tem um trabalho excelente com relação a isso. É o Programa Integrado de Estudos dos Índios do Nordeste – PINEB, dirigido pela Prof. Maria Rosário Gonçalves de Carvalho e pelo Prof. Pedro Agostinho da Silva. Nós temos também estudos voltados para o mundo afro-brasileiro, vários estudiosos do mundo afro-brasileiro estão pesquisando as condições de vida das comunidades afro-brasileiras. No país inteiro, há muita coisa que se tenta fazer, aqui também. Eu acredito que isso pode ser interessante para a discussão.

E nos estudos sobre a arte, o senhor acha que esta questão sendo está bem representada?

Nem tudo gira em torno da arte, não é? Eu pessoalmente não estou muito a par do que se vem fazendo nas escolas de arte da Bahia, não tenho acompanhado. Acho que o Paulo é melhor para falar disso do que eu. Acredito que nós temos grandes mestres, estudiosos do assunto, acredito que eles são capazes de discutir com muita pertinência.
Para uma pesquisa mais aprofundada, que bibliografia o senhor indicaria?
A bibliografia que eu posso dar sobre isso é imensa, a diversidade cultural hoje conta com bibliotecas inteiras tratando sobre isso... Mas eu preferia falar de uma outra coisa. Eu dirijo um grupo de pesquisas voltado para o estudo da etnobiologia e da etnoecologia como ciência, de um modo geral. Eu estou pensando em aproveitar a ocasião da SBPC para instituir um prêmio de estupidez ecológica. Já tenho alguns candidatos, o Rachtur, por exemplo, pela política estúpida de terceirização sistemática, de depreciação da Petrobrás, tem se traduzido em calamidades ecológicas das piores. Outro é o presidente Fernando Henrique Cardoso. Talvez um dos maiores exemplos de imbecilidade ecológica seja o projeto de transposição do Rio São Francisco, sobretudo nas atuais condições de crise energética no Brasil. Sem a crise energética, já é uma denúncia da imbecilidade ecológica. Então eu proponho à SBPC que institua um prêmio, que será a conferência do título de Grande Imbecil Ecológico, e será dado a quem o merecer. Eu desde já apresento esses dois candidatos: André Filipe Rachtur e Fernando Henrique Cardoso.

 

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